quinta-feira, 15 de fevereiro de 2007

Lord Save the Queen.


Eu tenho uma grande amiga que gosta de chamar seus casos amorosos de “príncipes”. Embora alguns estejam mais pra sapos ou pra algum membro real menos valorizado, são todos “príncipes”. Não sou das pessoas mais inclinadas ao romantismo da vida real, mas compreendo a denominação. A nobreza, mesmo em países republicanos como este no qual vivemos, sempre inspirou um delicioso encanto e mistério.
Hoje eu fui ao cinema assistir uma rainha de verdade: Helen Mirren.
O ruim de assistir filmes indicados ao Oscar é que é difícil dissociar a indicação da sua critica pessoal, ou seja, é difícil assistir sem pré-julgamentos, sem pensar nas indicações. Dessa forma, é praticamente impossível assistir Mirren sem lembrar do Globo de Ouro e das milhares de criticas positivas que já li sobre seu desempenho em A Rainha ( The Queen, de Stephen Frears, 2006 ).
O filme mostra os bastidores da família real, com enfoque, obviamente, na rainha Elisabeth II, em um momento bastante delicado de seu ainda atual reinado: os dias que precederam o funeral de Lady Di, em 1997. Pela primeira vez, nós, meros-mortais-não-escolhidos-por-Deus tivemos acesso, ainda que fictício, a esses dias pelo lado de dentro.
Helen Mirren assusta pela semelhança física com a rainha da vida real. Felizmente, esse não é nem de longe o ponto principal de sua performance. Não há um suspiro, um olhar, um momento sequer no qual ela fuja do personagem, uma mulher nascida e criada dentro de restritas e intolerantes tradições, que preza por estas e pelo legado de sua família, e vê de perto a possibilidade do desmoronamento de tudo isso ao recusar se expressar publicamente ou demonstrar condolências pela mulher que, apesar de ter sido um ícone de classe, beleza e caridade, passou a vida inteira tentando transgredir e abolir tudo o que Elisabeth II mais amava.
A rainha é, no filme, o que foi tantas vezes da sua vida real: coadjuvante. Embora no longa seja tecnicamente a protagonista, Mirren acaba por assumir, propositalmente, um papel quase que secundário. E não só por ser figura de uma monarquia parlamentarista na qual o rei reina mas não governa (vamos combinar...ela não apita em nada...), mas em relação à própria Diana. Não a mulher, mas o legado e o carisma da “princesa do povo”, que tantas vezes em vida ofuscou o brilho da família real e, com sua morte, conseguiu dar ainda mais dor de cabeça.
O filme me chamou atenção e, convenhamos, me ganhou, por ser uma obra iconoclasta. Há não só a destruição do ícone, como isso é feito pela humanização dele. Ultrapassa-se a imagem da rainha e o respeito e temor que a mesma nos impõe e nos mostra a mulher, a avó cuidadosa e preocupada, dividida entre os afazeres da família e o papel perante a sociedade que foi forçada a assumir. No fim das contas, o ser humano confuso diante da inevitável “modernização” e conseqüente abolição de tudo aquilo que ela acreditou durante toda a vida, como evidencia a cena na qual ela chora sozinha e em silêncio, e como dedica ao cervo morto a emoção e o pesar que talvez gostaria de mostrar à mãe de seus netos.

A Rainha foi um daqueles filmes que me fez sair pensando em várias coisas.
Em primeiro lugar, me fez voltar pra casa pensando em algo sério: como aqui no Brasil somos tão carentes de heróis. Não tivemos participação ativa em guerras, tampouco grandes e heróicas batalhas em nossa historia. Tivemos um ou dois grandes inventores e pensadores. Dessa forma, admiramos e glorificamos jogadores de futebol, integrantes de reality shows e celebridades descaradamente manipuladas e montadas. E isso é muito, muito triste. Heróis existem para serem admirados e quase que endeusados. São melhores, mais capazes que nós. Ok, são seres humanos passiveis de erros, mas conseguiram feitos fantásticos e admiráveis, tanto intelectual quanto fisicamente. Não podem se igualar tão facilmente aos meros súditos e, ainda assim, até mesmo Chico Buarque, um dos melhores de nós hoje e sempre, podemos encontrar facilmente caminhando pela praia do Leblon. É triste não ter heróis do nosso povo, que falem português e tenham sangue latino-negro-branco-índio correndo nas veias. Porque, perdoem-me os fãs, mas não quero criar meu filho pra ele ser igual ao Ronaldinho Gaúcho. Morreria se minha filha virasse pra mim e falasse “mãe, tudo que eu mais quero na vida é rebolar num grupo de axé.”.

Em segundo lugar, A Rainha conseguiu o que eu não esperava: me fez ter um pouco mais de afeto por Elisabeth II. Confesso que fazia parte da multidão que lamenta todos os dias a morte de alguém como Diana, uma perda irreparável para a humanidade num geral, e achava um profundo absurdo a posição da Rainha em relação a tudo que aconteceu. Hoje, depois de ver o filme, consigo entende-la mais. E isso é bom. Quando o cinema consegue mudar sua concepção sobre alguma coisa para a melhor é quase que um milagre.
E é para buscar, diária e apaixonadamente esse milagre, que eu vivo.

Os súditos se curvaram diante da Rainha em uma das ultimas seqüências, quando ela vai com a família real ver as flores deixadas para Lady Di na porta do Palácio. Que a Academia também preste sua reverência a Helen Mirren com um daqueles bonequinhos dourados tão cobiçados. Seria, finalmente, o reconhecimento máximo do seu inegável talento.
Não, não vai levar Melhor Filme. Mas isso não importa agora. A Rainha atinge um objetivo maior sem precisar da estatueta. Nele, vemos o que não vimos e, espera-se, calamos os precipitados julgamentos.


No mais, até mais.
Carolina

terça-feira, 6 de fevereiro de 2007

Promessa é dívida. Pago quando quiser.


Sabe aquelas resoluções de ano novo? Quando, nos últimos dias do ano, tomado por aquela atmosfera de esperança, desejos a serem realizados e ansiedade pela bebedeira de fim de ano, você pára, pensa nos dias que se passaram e promete pra si mesmo que, no ano que vem, tudo vai ser diferente. Você vai emagrecer, vai levar a sério a dieta e a academia. Não vai mais falar palavrão, tampouco xingar no trânsito. Não vai sair beijando qualquer um por aí, vai se dar mais valor, quer um compromisso sério. Daí o ano começa, os primeiros dias vêm, as primeiras semanas passam e a sua freqüência na academia não deu nem pra queimar as calorias da ceia de natal. Você já xingou a mãe de pelo menos cinco motoristas e até aprendeu algumas dirty words em outros idiomas com os gringos que conheceu no reveillon. Os mesmos gringos aleatórios que você já começou o ano beijando, cada um de uma nacionalidade diferente. E viva a globalização!
Sim, é preciso paciência e dedicação pra cumprir as resoluções. A grande questão é que todas elas, todas as promessas utópicas que fazemos, nos levariam, caso cumpridas, à condição de seres humanos melhores. Mas nem sempre queremos ser seres humanos melhores! Alguns vícios são bons...não há como negar. Traçar uma barra de chocolate deitadão no sofá vendo Sessão da Tarde pode ser, eventualmente, mais legal do que suar até os intestinos em uma aula de spinning. E vai dizer que um bom “Filho da P***ta, olha por onde anda, ca****ho!!! Comprou a carteira, seu imecil?? ##$% &$% #¨&% !!!!! ”, não libera toda a tensão e torna seu dia infinitamente melhor?

É...eu não tenho conseguido cumprir algumas das minhas resoluções. Aliás, hoje mesmo eu estou ansiosa por quebrar uma delas. Porque hoje é terça. Terça feira. E todo brasileiro minimamente interado sabe o que tem terça feira.
Terça feira é o dia da semana de maior tensão. Aquele dia que você até abstrai a deliciosa presença do Thiago Lacerda na novela das oito e torce pra que esta acabe logo pra você ouvir a voz ... dele! Ele! Ele ... Pedro Bial. Sim, terça feira é dia de eliminação no Big Brother Brasil.
No fim de 2006, quando estavam começando a ser vinculadas as chamadas do programa eu esbravejava: “ahh outro?? Alguém ainda tem saco pra ver isso? Não vou assistir de jeito nenhum!!”.
Pois é. Admito. Eu assisto Big Brother. Não assiduamente. Não sei o nome de quase ninguém, não tenho pay per view, não assisto todos os dias, não tenho um participante favorito pra ganhar o milhão, quase nunca sei quem é anjo e quem é líder, não gasto tempo nem dinheiro votando e, pra ser totalmente sincera, até confundo as pessoas lá dentro. Volta e meia acho que um é outro, que uma delas estava pegando um deles quando, na verdade, ela estava é pegando outro, e quem estava pegando o primeiro é uma quarta, que, francamente, se parece muito com a primeira. Mas assisto mesmo assim. A televisão fica ligada e, sem que eu tenha o menor controle, alguma força fora do normal atrai como um imã super poderoso a minha atenção pra tv.
Por que não consigo quebrar essa resolução? Por que meus impulsos voyeristas são mais fortes que a minha força de vontade?
Deve ser porque, lá no fundo, não tenho tanta vontade assim de abolir isso.
Não quero ser uma pessoa melhor. Assistir ou não Big Brother não elimina em mim aquilo que eu quero acreditar que eu sou: “estudante-de-comunicação/cinema-interessanda-em-artes-leitora-assídua-buscando-maximizar-sua-cultura.” . E pra ser sincera, odeio esses papinhos pseudo-intelectuais de gente que se acha melhor porque já leu tudo de Dostoiévski e já vi tudo de Godard. Sim, Dostoievski e Godard são cool, uma vez ou outra. Mas há dias em que tudo que você quer é um bom Dan Brown seguido pela trilogia de American Pie.

Fato é que eu pouco me importo com o que acontece dentro da casa. Não dou a mínima pra nenhum dos “brothers”, como diz o Bial (aliás, Bial sim, é rei!). Acho um milhão de reais dinheiro demais pra premiar uma pessoa que sobreviveu aos estupendos banquetes nas festas com bebida mais do que liberada e realmente sofreu por passar seus dias se bronzeando naquela piscina maravilhosa. Tenho todas as críticas ao programa mas, mas assim, assisto, ainda que esporadicamente.
Gosto de ser inútil as vezes. Gosto de poder parar um pouco de pensar. Dá trabalho ficar inteligente.
Em breves momentos, a mediocridade é necessária pra me colocar no meu devido lugar, e não correr o risco de virar uma pseudo-intelectual insuportável que entende mais ou menos de alguma coisa e acha que sabe mais do que todo mundo, como tantos que eu faço questão de desprezar. É a fuga que todos nós precisamos para sobreviver.

Big Brother é minha barra de chocolate. Minha ausência consentida na academia. Meu dedo do meio pro cara do carro ao lado. Meu gringo aleatório. Minha falta de respeito por mim mesma.

E atire a primeira pedra quem não tem um Big Brother na vida.
No mais, até mais.
Carolina
ps: já estamos, efetivamente, no mês do Oscar! Run, people, run !!!